quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

MINHA VOZ QUE NÃO QUER CALAR 3




Esse foi mais um ano atribulado na minha vida, talvez o mais inconstante dos últimos 5 anos.
Tenho por meta na vida não reclamar dos problemas e encarar tudo de cabeça erguida, mas sinto que estou perdendo um pouco da minha estrutura emocional e em alguns momentos até me deixando abater pelo desânimo, mais isso não é culpa minha, isso também não significa que eu esteja fraquejando e entregando os pontos, o problema é porque tudo isso já se arrasta por longos 10 anos e eu sinto que estou começando a me sentir cansado e saturado desses problemas.
Eu sou portador de uma doença cronica chamada Pênfigos Vulgar, acho que todo mundo já sabe disso (menos a Secretaria de Saúde), o problema é que, para manter a minha auto-estima lá em cima e para não sucumbir aos efeitos do tratamento, eu tive que arranjar uma atividade que ocupasse o meu tempo e ao mesmo tempo servisse de ponte para que eu pudesse ajudar várias pessoas ao mesmo tempo, cumprindo assim uma promessa que fiz quando comecei a sentir os primeiros sintomas da doença em 2001, então ser radialista veio a calhar para o que eu precisava, o problema é que minha laringe também foi afetada, e logo tive que me desligar do rádio para começar uma série de cirurgias nas cordas vocais interrompendo assim minha trajetória de radialista e começando a viver mais um pesadelo na minha vida.
Em Janeiro, eu me preparei para ser o comentarista da equipe da Rádio Regional nos jogos do Guarany quando o jogo fosse fora de Sobral. Eu estava muito empolgado, até porque eu sou apaixonado por rádio e futebol, mas nem tudo é como a gente quer e logo no primeiro jogo fora do Guarany em Limoeiro, eu comecei a sentir na volta pra casa fortes dores no corpo e uma sensação estranha de febre. Na época, eu tinha participação em 4 programas diários e tive que aos poucos ir me desligando deles para cuidar da saúde com mais empenho. Em Fevereiro acabei descobrindo no Hospital das Clínicas em Fortaleza onde faço tratamento do Pênfigos que a causa da febre era uma Infecção Pulmonar (Tuberculose) com 3 cruzes e que eu tinha que me internar ás pressas para começar logo um tratamento e conter a febre que era constante e chegava aos 40 bem fácil. Então no dia 4 de Fevereiro eu me internei saindo 7 dias depois já com o tratamento do pulmão bem encaminhado e sem a forte febre que tanto me atormentava. Eu até aquele momento estava fazendo 3 tratamentos no Hospital das Clínicas, do Pênfigos (pele), do pulmão e do diabetes. Quando foi em Abril eu comecei a sentir uma forte rouquidão e com ela veio também o medo e a preocupação, pois agora estaria voltando uma coisa que estava adormecida há 4 anos e que eu não imaginaria que voltasse de forma forte e veemente. Então não tinha outra opção a não ser procurar o serviço de otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas para encontrar a cura. O atendimento foi rápido, como sempre foi nesse hospital desde o primeiro dia de atendimento em 2001, o médico residente que me atendeu fez uma laringoscopia e disse que tinha suspeita de uma patologia e marcou para eu voltar em uma semana para ser avaliado pelo médico professor (Dr. André Alencar) que é meu amigo e que já me conhecia desde a primeira cirurgia. Essa palavra de suspeita deixou uma forte tristeza em mim, que já me sentia abalado desde o inicio do tratamento da TB, pois o desgaste emocional que eu estava passando era muito grande, talvez até pelo efeito colateral da medicação dos 3 tratamentos que eu estava fazendo, e também pelo quadro do meu tio que piorava a cada dia, porém, eu sabia que era mais um desafio que eu tinha que enfrentar e que Deus como pai continuaria ao meu lado. Dr. André pediu uma laringoscopia e explicou para os outros médicos residentes que eu era portador de uma doença auto-imune e que aquelas lesões poderia ser consequencias dessa patologia, então falou que o problema não era grave, mas necessitaria de uma cirurgia para retirada das lesões. A cirurgia foi marcada e os exames pedidos para avaliação do pulmão e do diabetes, porém teve que ser adiada por duas vezes, esse adiamento representava pra mim que o problema realmente não era grave e que poderia ser guardado para ser resolvido no tempo certo. Enquanto aguardava, eu vivia minha vida normalmente e trabalhava na campanha para a reeleição do Dep. Padre Zé à Câmara Federal, pois tinha dele a promessa de buscar meus filhos que moram na Itália para passarem um mês comigo, e essa oportunidade eu não podia perder, e mesmo debilitado me empenhei na campanha, mais sempre indo a Fortaleza no Hospital para acompanhamentos periódicos. Durante esse tempo eu vivi dois momentos diferentes na minha vida, um bom que foi os 50 anos de casamento de meus pais, e um ruim que foi a descoberta de um câncer maligno no meu tio Raimundo Nonato Pereira (Sgt. Lambisca), esse contraste entre o alegre e o triste mexeu muito comigo, pois minha vida era cuidar de pessoas doentes e proporcionar um pouco de qualidade de vida ás pessoas, mas diante daquele problema do meu tio eu me sentia inerte e não encontrava uma forma de ajuda-lo, até porque já era dito pelos médicos que seu quadro chegaria a óbito, e essa sensação de incapacidade me deixava mais debilitado ainda. A cirurgia estava marcada para o dia 19 de Novembro com internação para o dia 18, então no dia 17 eu parti sozinho para Fortaleza levando comigo muita esperança e um pouco de angústia por ter que passar por aquilo longe de casa e da família. Eu quando vou viajar para enfrentar um problema em Fortaleza, me preparo como se fosse para uma guerra, vejo o que está a meu favor, ex.: alguns amigos, minha fé, minha vontade de viver, meus objetivos para o futuro, a vontade de ver meus filhos, a facilidade do hospital no atendimento e o prazer de vencer mais uma batalha, vejo também o que tá contra, ex.: o descaso dos políticos que ajudei a eleger, o descaso dos amigos do rádio que eu colaborava diariamente com minhas participações, o pouco conhecimento do órgão publico sobre minhas patologias (mesmo com 10 anos de tratamento), a falta de recursos financeiros para passar 20 dias em Fortaleza até o retorno ao hospital para avaliação médica, sem contar com a perca parcial da minha voz, que é o meu principal instrumento de trabalho e defesa. Cheguei no hospital no dia 18 e antes da internação, o médico pediu para ser feito mais uma laringoscopia, o que é um procedimento normal em caso de cirurgia, o que estava certo era que seria uma cirurgia simples, mais na laringoscopia os médicos viram outra coisa e a cirurgia passou a ser especificamente para biopsia. As 11 horas eu estava internado e enquanto controlava a diabetes eu aguardava o procedimento cirúrgico que seria no outro dia, no quarto que eu estava tinha um paciente comigo, mas logo ele recebeu alta e eu fiquei sozinho, e sozinho eu comecei a refletir sobre a minha vida e tudo que estava acontecendo comigo, avaliei o ano pelas coisas boas que aconteceram e vi que elas foram mais do que as ruins, eu não tenho medo de cirurgia nem de hospital, até porque não é todo mundo que tem a sorte de encontrar um hospital que lhe recebe de braços abertos e é uma referência em atendimento no estado do Ceará, porém, o que me intrigava era uma palavra que era repetida inúmeras vezes sempre que alguém vinha conversar comigo, suspeita, essa palavra mexia com minha estrutura e baixava a minha auto-estima, mas solução para problema você só encontra enfrentando e era pra isso que eu estava ali. Quando foi às 12 horas eu fui encaminhado para a sala de operação, e durante o trajeto aquela palavra era repetida varias vezes, e eu comecei a sentir medo. Acordei na sala de recuperação às 5 horas da tarde com o médico ao meu lado que me entregou o material colhido na cirurgia e pediu que eu fizesse biopsia particular , pois o resultado no hospital demoraria para sair e eles tinham pressa, pois se desse algo mais sério um tratamento seria feito de imediato. No sabádo dia 20 eu recebi alta, Roberto um amigo meu foi me buscar no hospital e me levar pra sua casa, no caminho passamos na farmácia para comprar remédios e algumas frutas e leite, pois eu ia ter que tomar muito líquido para ajudar na recuperação, falei com ele e com sua esposa sobre a biopsia e ele se comprometeu a levar o material para o laboratório e pagar o preço que fosse para o resultado sair logo, isso me deixou mais tranquilo, pois vi que naquela luta eu não estava sozinho. O prazo que o médico deu para voltar ao hospital era quando tivesse com o resultado da biopsia em mãos, até lá eu teria que fazer repouso vocal por 12 dias, isso era ruim pra mim, pois sou chegado em uma boa conversa, mais me contentava em me comunicar através da escrita. Durante essa espera eu passei por momentos angustiantes, não conseguia dormir e a comida não tinha sabor em minha boca, os dias eram longos e as noites intermináveis, e para aumentar meu tormento o meu tio faleceu na mesma hora que eu estava sendo operado, mas eu tinha que viver a realidade e encarar o que viesse. Voltei ao hospital 15 dias depois já com o resultado do exame em mãos, naquele instante eu já estava mais tranquilo, pois o que viesse eu enfrentaria de cabeça erguida, o médico viu o resultado e disse que não deu nada grave, apenas a mesma coisa que deu nas outras cirurgias, ou seja uma displasia moderada, fizemos outra laringoscopia e estava tudo bem e minha voz voltava ao normal.
Estou escrevendo esse texto para mostrar o quanto é difícil lutar contra uma doença cronica tendo que fazer várias viagens a Fortaleza com poucos recursos e em algumas vezes sem recurso algum, tendo também que encontrar dificuldades para receber a medicação e conseguir transportes, pois o pior da doença não é a dor que ela causa e sim as dificuldades que são encontradas, eu tenho a sorte de ter muitos amigos em Fortaleza que sempre me acolhem com carinho e me dão estrutura para vencer os desafios, tem também um hospital que atende com respeito o paciente e um quadro de médicos que são uma verdadeira família, mas Sobral mesmo sendo a maior cidade da zona norte não tem uma casa de apoio em Fortaleza, e a maioria dos pacientes de Sobral ficam a mercê de sua própria sorte. Eu nessa viajem sabia que mesmo tendo casa para ficar e alimentação, eu ia precisar de no mínimo 600 reias, mais viajei com apenas 80, e graças a Deus não me faltou nada.
Quero agradecer ao Roberto, a Francine, a Bia, a Carol, a Catarina e a Carminha, pelo acolhimento e o carinho, ao Dr. André Alencar e sua equipe por tratar paciente como gente e como ser humano, ao Pedro Neves pela preocupação e pela disponibilidade, aos amigos do rádio que torceram e pediram orações em meu nome, as pessoas simples que anônimamente fazem promessas e querem o bem da gente, em fim aos amigos e a família, e principalmente a DEUS, QUE NÃO DEIXA A MINHA VOZ CALAR.